sábado, 12 de abril de 2014

Guia do amador de Belas Artes. Daniel Martins de Moura Guimarães

Sem fins lucrativos, e sem ideias de vanglória, ofereço hoje ao publico o presente livro.
Antes porém que o leitor o analise, seja-me lícito expor as causas que o motivaram.
Querendo viajar pela Europa em 1865, procurei um guia que me desse notícia do que pelos diversos países existe de mais notável. Em português não encontrei nenhum completo.
O único existente, o Luso-Brasileiro, era já antigo, e por essa razão insuficiente, visto que uma grande parte das coisas tinha sofrido a natural alteração do tempo, principalmente no tocante a estradas, colecções, hotéis, etc.
O melhor que encontrei foi o de Mr. Baedecker, escrito em francês, mas com o grande inconveniente de não descrever a nossa península, sendo além disso demasiado extenso, pois ocupam oito volumes os guias para a Europa central. Tive mais tarde para suprir aquela deficiência, de comprar outro, o de Mr. Laringe, vindo assim a achar-me com o pecúlio de informações que desejava, mas derramadas em quatro mil e tantas páginas. Em 1867, querendo fazer uma terceira viagem, achei-me embaraçado com tantos guias; fiz um resumo do que havia de mais notável nos países que havia percorrido, levando simplesmente os volumes relativos aos que ia ver de novo.
Mas quantas viagens se aumentam depois de estar-se em marcha?
Quantas pessoas não têm, antes de empreendê-las, o tempo ou a paciência precisa para tantas notas?
E a quantas, enfim, deixa de ser familiar a língua francesa?
Estas considerações fizeram-me conceber a esperança de que, mesmo sem habilitações, poderia contribuir para popularizar a nossa maior ou menos riqueza em belas artes, quase virgens de explorações estrangeiras; publicando um guia ao qual adicionasse opiniões competentes e sinaleiras àquele respeito, e que, pela sua utilidadeno que é descritivo, se tornasse, a bem dizer, um meio de forçar o viajante leigo a adquirir instruções sobre a pintura, minha mania ou paixão dominante.
Divdi portanto o meu trabalho em duas partes, entrando na primeira o que é simplesmente descritivo, para o que me auxiliei dos guias já mencionados, e com respeito a Portugal de alguns esclarecimentos do Sr. Vilhena Barbosa e de outros cavalheiros, que estou certo não mo levarão a mal.
Na segunda parte, exclusivamente artística, dividi a pintura por escolas, parecendo-me assim estabelecer melhor o paralelo do que temos produxzido neste ramo e mais facilmente avaliar a importância relativa do lugar que nele ocupamos.
Para isso, auxiliei-me de diversos escritores, adoptando em geral a opinião de Mr. Louis Viardot, e com relação a Portugal a de Mr. Raczynski, cujas obras de ambos não ocupam menos de outras quatro mil e tantas páginas.
Creio pois deste modo ter explicado o meu fim e merecer desculpa de ter denominado Guia do Amador de Belas Artes um tão insignificante trabalho, levando-se-me em conta que o apresento como um resumo das obras que mencionei, que entra aqui muito amor pelo que é nosso, e que o líquido do que produzir será em benefício do Asilo de Mendicidade do Porto, minha pátria.

D. M. de M. G, Guia do Amador das Belas Artes. Porto, Tipografia Comercial, 1871, p. 3-5.

Notas:
Daniel Martins de Moura Guimarães, natural de Gondomar, partiu para o Brasil, em 1844. Tinha dezassete anos. Regressou ao Porto, em 1867, senhor de uma apreciável fortuna. Tornou-se negociante de arte e investiu na indústria e nos serviços. Viajou pela América, Europa e Oriente. Fundou, em 1894, o Grande Hotel do Porto, na Rua de Santa Catarina. Entre a sua descendência, refira-se o seu trineto Pedro Abrunhosa.


Louis Viardot publicou entre 1852 e 1855 Les Musées d'Europe. Guide et Memento de l'artiste et du voyageur, 5 volumes (Itália, Espanha; Alemanha; Inglaterra, Bélgica, Holanda e Rússia; França)

Atanazy Raczynski publicou em 1846, em Paris, Les arts en Portugal : lettres adressées a la société artistique et scientifique de Berlin et accompagnées de documents

Vilhena Barbosa publicou em 1860 As cidades e vilas da monarquia portuguesa que têm brasão de armas.

Karl Baedeker, alemão, fundou em 1827 uma empresa editora de livros de viagens. A editora teve continuidade, após a mote de Karl, pelas mãos dos seus filhos. Os livros que publicou foram popularizados com o nome da própria editora.

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