About suffering they were never wrong, The Old Masters; how well, they understood Its human position; how it takes place While someone else is eating or opening a window or just walking dully along; How, when the aged are reverently, passionately waiting For the miraculous birth, there always must be Children who did not specially want it to happen, skating On a pond at the edge of the wood: They never forgot That even the dreadful martyrdom must run its course Anyhow in a corner, some untidy spot Where the dogs go on with their doggy life and the torturer's horse Scratches its innocent behind on a tree. In Breughel's Icarus, for instance: how everything turns away Quite leisurely from the disaster; the ploughman may Have heard the splash, the forsaken cry, But for him it was not an important failure; the sun shone As it had to on the white legs disappearing into the green Water; and the expensive delicate ship that must have seen Something amazing, a boy falling out of the sky, had somewhere to get to and sailed calmly on.
«Trouxe o filho de Jápeto do Céu o fogo que ajuntou ao peito humano, fogo que o mundo em armas acendeu, em mortes, em desonras (grande engano). Quanto melhor nos fora, Prometeu, e quanto para o mundo menos dano, que a tua estátua ilustre não tivera fogo de altos desejos, que a movera!
Não cometera o moço miserando o carro alto do pai, nem o ar vazio o grande arquitetor co filho, dando um, nome ao mar, e o outro, fama ao rio. Nenhum cometimento alto e nefando por fogo, ferro, água, calma e frio, deixa intentando a humana geração. Mísera sorte! Estranha condição!»
Camões, in Os Lusíadas, canto IV, estâncias 103 e 104
Definitivo, como tudo o que é simples. Nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.
Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.
Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.
Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender.
Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada.
Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar.
Por que sofremos tanto por amor? O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável, um tempo feliz.
Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso:
Se iludindo menos e vivendo mais!!! A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.
Em Brueghel, o velho, mais do que Ícaro ( e do que seu pai, Dédalo, ausente da pintura), são importantes as personagens que reagem à respetiva queda. Ao contrário da mitologia, ou em reação a ela, onde o enfoque é colocado na ousadia de Ícaro, dada a desobediência que o leva a elevar-se até ao sol, que lhe derrete as asas, aqui a imagem reflete o que se passa em consequência dessa ousadia: a queda. E o efeito que essa queda causa no lugar onde ocorreu. Muito interessante esta pintura, em sua nova versão e dimensão. Reinterpretando o mito. E de tudo isto se faz a nossa humanidade...
ALBATROZ Sou o segundo. Não piso terra. Voo o mundo.
"Todo o mar nos meus olhos, e não basta! Enche-os mais uma lágrima, furtiva... Neste banquete azul, há só um conviva Farto e feliz. É o céu, que se debruça sobre as ondas Sem amargura. É ele, que não procura Por detrás da verdade outra verdade. Serenamente, lá na eternidade, Bebe e come A imagem reflectida do seu nome."
Miguel Torga, "Vazio" IN ANTOLOGIA POÉTICA, Coimbra, 1981, pp. 319.
"Não sabemos para onde vamos, mas isso também não importa. E não por acaso, sem o termos feito expressamente, encontramo-nos sem verdadeiramente sair de casa, com o sentimento de sermos simbolicamente ubíquos e oniricamente universais."
(...)
"Nem como língua, nem como cultura, nem como ficção os tão celebrados termos camonianos de uma só alma pelo mundo em pedaços repartida. O imaginário lusófono tornou-se, definitivamente, o da «pluralidade» e da «diferença» e é através dessa evidência que nos cabe, ou nos cumpre, descobrir a comunidade e a confraternidade inerentes a um espaço cultural fragmentado, cuja unidade utópica, no sentido da partilha comum, só pode existir pelo conhecimento cada vez mais sério e profundo, assumido como tal, dessa pluralidade e dessa diferença."
Eduardo Lourenço. A Nau de Ícaro e Imagem e Miragem da Lusofonia. Lisboa. Gradiva, 1999. pp. 16 e 111
Há já uns dias que o Autor do blog, muito sábio, nos obrigava a reflectir sobre a dicotomia loucura/mediania. Hoje, através do “Velho” flamengo Brueghel, ela é ainda mais evidente. Um quadro de ambiente renascentista, com cenas do mundo do trabalho, um homem com seu arado, outro que interroga o alto, mas sem descuidar o rebanho, um pescador absorto, um mar com um navio que tranquilo navega e um título que obriga a procurar Ícaro que já quase não existe na tela. Ele acaba de mergulhar quase totalmente e em queda de cabeça, humilhado, só nos apercebemos da sua nudez e da descompostura da sua posição, contrastante com as outras personagens. O louco e desobediente filho de Dédalo, quase imerso, remete-nos para o fracasso individual e doloroso… Como diz Isabel X., é a destruição do mito e do mundo medieval teocentrista. É também a apresentação de um novo paradigma, uma nova ordem, o da “aurea mediocritas”… em que o mundo do trabalho se sobrepõe a fenómenos de natureza mítica…. Ícaro está morto e as personagens são “cegas” (vd. A Parábola dos Cegos) e não o socorreram nem olharam. Eis o Renascimento e a questão, loucura ou mediania? Mas depois da interpretação de Auden, no séc. XX, que refere com tanta pertinência o alheamento colectivo do sofrimento… como não ver, ao olhar Brueghel, esse sofrimento de que todos fogem e se alheiam? “In Breughel's Icarus, for instance: how everything turns away Quite leisurely from the disaster; the ploughman may Have heard the splash, the forsaken cry, But for him it was not an important failure; the sun shone As it had to on the white legs disappearing into the green Water; and the expensive delicate ship that must have seen Something amazing, a boy falling out of the sky, had somewhere to get to and sailed calmly on.”
Melhor ainda, de facto, com William Carlos Williams, em "Landscape....", a metalinguagem cumpre-se na dolorosa morte do "Icarus drowning", qual poema, qual vida humana... Estes versos mostram, ainda mais de cima, o desejo sempre reiterado do Homem de se ultrapassar, tal como MC já citara: "Nenhum cometimento alto e nefando Por fogo, ferro, água, calma e frio, Deixa intentado a humana gèração. Mísera sorte! Estranha condição!"
«Gosto daquele que sonha o impossível»
ResponderEliminarGoethe
«Tenho em mim todos os sonhos do mundo»
ResponderEliminarFernando Pessoa
Fall of Icarus
ResponderEliminarAbout suffering they were never wrong,
The Old Masters; how well, they understood
Its human position; how it takes place
While someone else is eating or opening a window or just walking dully along;
How, when the aged are reverently, passionately waiting
For the miraculous birth, there always must be
Children who did not specially want it to happen, skating
On a pond at the edge of the wood:
They never forgot
That even the dreadful martyrdom must run its course
Anyhow in a corner, some untidy spot
Where the dogs go on with their doggy life and the torturer's horse
Scratches its innocent behind on a tree.
In Breughel's Icarus, for instance: how everything turns away
Quite leisurely from the disaster; the ploughman may
Have heard the splash, the forsaken cry,
But for him it was not an important failure; the sun shone
As it had to on the white legs disappearing into the green
Water; and the expensive delicate ship that must have seen
Something amazing, a boy falling out of the sky,
had somewhere to get to and sailed calmly on.
Wystan Hugh Auden
«Trouxe o filho de Jápeto do Céu
ResponderEliminaro fogo que ajuntou ao peito humano,
fogo que o mundo em armas acendeu,
em mortes, em desonras (grande engano).
Quanto melhor nos fora, Prometeu,
e quanto para o mundo menos dano,
que a tua estátua ilustre não tivera
fogo de altos desejos, que a movera!
Não cometera o moço miserando
o carro alto do pai, nem o ar vazio
o grande arquitetor co filho, dando
um, nome ao mar, e o outro, fama ao rio.
Nenhum cometimento alto e nefando
por fogo, ferro, água, calma e frio,
deixa intentando a humana geração.
Mísera sorte! Estranha condição!»
Camões, in Os Lusíadas, canto IV, estâncias 103 e 104
Definitivo
ResponderEliminarDefinitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.
Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos
o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções
irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado
do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter
tido junto e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que
gostaríamos de ter compartilhado,
e não compartilhamos.
Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.
Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas
as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um
amigo, para nadar, para namorar.
Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os
momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas
angústias se ela estivesse interessada em nos compreender.
Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada.
Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo
confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam,
todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar.
Por que sofremos tanto por amor?
O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma
pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez
companhia por um tempo razoável, um tempo feliz.
Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um
verso:
Se iludindo menos e vivendo mais!!!
A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida
está no amor que não damos, nas forças que não usamos,
na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do
sofrimento, perdemos também a felicidade.
A dor é inevitável.
O sofrimento é opcional...
Carlos Drummond de Andrade
Em Brueghel, o velho, mais do que Ícaro ( e do que seu pai, Dédalo, ausente da pintura), são importantes as personagens que reagem à respetiva queda. Ao contrário da mitologia, ou em reação a ela, onde o enfoque é colocado na ousadia de Ícaro, dada a desobediência que o leva a elevar-se até ao sol, que lhe derrete as asas, aqui a imagem reflete o que se passa em consequência dessa ousadia: a queda. E o efeito que essa queda causa no lugar onde ocorreu.
ResponderEliminarMuito interessante esta pintura, em sua nova versão e dimensão. Reinterpretando o mito.
E de tudo isto se faz a nossa humanidade...
ALBATROZ
ResponderEliminarSou o segundo.
Não piso terra.
Voo o mundo.
"Todo o mar nos meus olhos, e não basta!
Enche-os mais uma lágrima, furtiva...
Neste banquete azul, há só um conviva
Farto e feliz.
É o céu, que se debruça sobre as ondas
Sem amargura.
É ele, que não procura
Por detrás da verdade outra verdade.
Serenamente, lá na eternidade,
Bebe e come
A imagem reflectida do seu nome."
Miguel Torga, "Vazio" IN ANTOLOGIA POÉTICA, Coimbra, 1981, pp. 319.
"Não sabemos para onde vamos, mas isso também não importa. E não por acaso, sem o termos feito expressamente, encontramo-nos sem verdadeiramente sair de casa, com o sentimento de sermos simbolicamente ubíquos e oniricamente universais."
ResponderEliminar(...)
"Nem como língua, nem como cultura, nem como ficção os tão celebrados termos camonianos de uma só alma pelo mundo em pedaços repartida. O imaginário lusófono tornou-se, definitivamente, o da «pluralidade» e da «diferença» e é através dessa evidência que nos cabe, ou nos cumpre, descobrir a comunidade e a confraternidade inerentes a um espaço cultural fragmentado, cuja unidade utópica, no sentido da partilha comum, só pode existir pelo conhecimento cada vez mais sério e profundo, assumido como tal, dessa pluralidade e dessa diferença."
Eduardo Lourenço. A Nau de Ícaro e Imagem e Miragem da Lusofonia. Lisboa. Gradiva, 1999. pp. 16 e 111
Há já uns dias que o Autor do blog, muito sábio, nos obrigava a reflectir sobre a dicotomia loucura/mediania. Hoje, através do “Velho” flamengo Brueghel, ela é ainda mais evidente. Um quadro de ambiente renascentista, com cenas do mundo do trabalho, um homem com seu arado, outro que interroga o alto, mas sem descuidar o rebanho, um pescador absorto, um mar com um navio que tranquilo navega e um título que obriga a procurar Ícaro que já quase não existe na tela. Ele acaba de mergulhar quase totalmente e em queda de cabeça, humilhado, só nos apercebemos da sua nudez e da descompostura da sua posição, contrastante com as outras personagens. O louco e desobediente filho de Dédalo, quase imerso, remete-nos para o fracasso individual e doloroso… Como diz Isabel X., é a destruição do mito e do mundo medieval teocentrista. É também a apresentação de um novo paradigma, uma nova ordem, o da “aurea mediocritas”… em que o mundo do trabalho se sobrepõe a fenómenos de natureza mítica…. Ícaro está morto e as personagens são “cegas” (vd. A Parábola dos Cegos) e não o socorreram nem olharam. Eis o Renascimento e a questão, loucura ou mediania?
ResponderEliminarMas depois da interpretação de Auden, no séc. XX, que refere com tanta pertinência o alheamento colectivo do sofrimento… como não ver, ao olhar Brueghel, esse sofrimento de que todos fogem e se alheiam?
“In Breughel's Icarus, for instance: how everything turns away
Quite leisurely from the disaster; the ploughman may
Have heard the splash, the forsaken cry,
But for him it was not an important failure; the sun shone
As it had to on the white legs disappearing into the green
Water; and the expensive delicate ship that must have seen
Something amazing, a boy falling out of the sky,
had somewhere to get to and sailed calmly on.”
Landscape With The Fall of Icarus
ResponderEliminarAccording to Brueghel
when Icarus fell
it was spring
a farmer was ploughing
his field
the whole pagentry
of the year was
awake tingling
near
the edge of the sea
concerned
with itself
sweating in the sun
that melted
the wings´ wax
unsignificantly
off the cost
there was
a splash quite unnoticed
this was
Icarus drowning
William Carlos Williams
Prémio Pulitzer em 1963
Melhor ainda, de facto, com William Carlos Williams, em "Landscape....", a metalinguagem cumpre-se na dolorosa morte do "Icarus drowning", qual poema, qual vida humana... Estes versos mostram, ainda mais de cima, o desejo sempre reiterado do Homem de se ultrapassar, tal como MC já citara:
ResponderEliminar"Nenhum cometimento alto e nefando
Por fogo, ferro, água, calma e frio,
Deixa intentado a humana gèração.
Mísera sorte! Estranha condição!"