sábado, 10 de maio de 2014

Lugares extraordinários: viagem às Berlengas (3)


















7 comentários:

  1. «Você, Zeca, tem raiva do passado, tem ciúme do futuro: vai viver só nos agoras?
    Reformado das pescas, nem no presente tenho cabimento. Enquanto andava no mar, embalado em meu barco, eu não sofria o tempo. Porque essa ondeação era, afinal, uma dança. E a dança, já disse, é melhor maneira de fugir do tempo.»

    Mia Couto, in Mar Me Quer

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  2. «Pois, lhe digo, minha Dona. É uma pena a senhora andar por aí fatigando seus olhos pelo mundo. Devia era, logo de manhã, passar um sonho pelo rosto. É isso que impede o tempo e atrasa a ruga. Sabe o que faz? Estende-se aí na areia, oblonga-se deitadinha, estica a alma na diagonal. Depois, fica assim, caladita, rentinha ao chão, até sentir a terra se enamorar de si. Digo-lhe, Dona: quando ficamos calados, igual uma pedra, acabamos por escutar os sotaques da terra. A senhora num certo momento, há de ouvir um chão marinho, faz conta é um mar sob a pele do chão. Aproveita esse embalo, Dona Luarmina. Eu tiro boas vantagens desses silêncios submarinos. São eles que me fazem adormecer ainda hoje. Sou criança dele, do mar.»

    Mia Couto, in Mar Me Quer

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  3. O lugar terra, as Berlengas, é extraordinário. Mas a vizinhança do mar, premente, em todos os lados, é presença maior.
    A fotografia de que mais gosto, deste conjunto, é a que é só mar. E a terra ali, tão próxima, adivinhada, pressentida.

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  4. Isabel X, só uma observação... essa fotografia é também a minha preferida, mas se é essa, há um cardume...não?!

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  5. Senhor Anónimo,

    Bem sugestivos os textos de Mia Couto... "E Agora José"?...

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  6. "- Você, você, Luarmina, é minha doença.
    - Eu prometo, Zeca, eu regresso depois, à noite, para curar de vez essa doença.
    - Mas Luarmina, jura que você é mesmo essa mulher do barco!
    Ela se cala. Cabeça baixa, murmura:
    - Vou deixar a porta aberta. Assim você escuta o mar...
    Escutando o mar adormeci. Mas não era eu todo que adormecia. De igual maneira que meu pai morreu em porções, agora eu caía no sono às partes, uma de cada vez. Primeiro, foi a memória que tombou no abismo, inexistindo. Como se o mar ensinasse, por fim, minhas lembranças a adormecer. Como se a minha vida aceitasse o supremo convite e fosse saindo de mim em eterna dança com o mar."

    Mia Couto, in Mar Me Quer

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