segunda-feira, 16 de junho de 2014

A passageira da cabine 54. Henri de Toulouse-Lautrec

Henri de Toulouse-Lautrec, The Passenger from Cabin 54 - On a Cruise (La passagère du 54-Promenade en yacht), 1896.

Color lithograph poster with brush, crayon, and spatter. Fine Arts Museums of San Francisco. Achenbach Foundation for Graphic Arts, Bruno and Sadie Adriani Collection.

7 comentários:

  1. Zone

    À la fin tu es las de ce monde ancien

    Bergère ô tour Eiffel le troupeau des ponts bêle ce matin

    Tu en as assez de vivre dans l'antiquité grecque et romaine

    Ici même les automobiles ont l'air d'être anciennes
    La religion seule est restée toute neuve la religion
    Est restée simple comme les hangars de Port-Aviation

    /.../
    Tu es dans le jardin d'une auberge aux environs de Prague
    Tu te sens tout heureux une rose est sur la table
    Et tu observes au lieu d'écrire ton conte en prose
    La cétoine qui dort dans le coeur de la rose
    Épouvanté tu te vois dessiné dans les agates de Saint-Vit
    Tu étais triste à mourir le jour où tu t'y vis
    Tu ressembles au Lazare affolé par le jour
    Les aiguilles de l'horloge du quartier juif vont à rebours
    Et tu recules aussi dans ta vie lentement
    En montant au Hradchin et le soir en écoutant
    Dans les tavernes chanter des chansons tchèques

    Te voici à Marseille au milieu des pastèques

    Te voici à Coblence à l'hôtel du Géant

    Te voici à Rome assis sous un néflier du Japon

    Te voici à Amsterdam avec une jeune fille que tu trouves belle et qui est laide
    Elle doit se marier avec un étudiant de Leyde
    On y loue des chambres en latin Cubicula locanda
    Je me souviens j'y ai passé trois jours et autant à Gouda

    Tu es à Paris chez le juge d'instruction
    Comme un criminel on te met en état d'arrestation

    Tu as fait de douloureux et de joyeux voyages
    Avant de t'apercevoir du mensonge et de l'âge
    Tu as souffert de l'amour à vingt et à trente ans
    J'ai vécu comme un fou et j'ai perdu mon temps

    Tu n'oses plus regarder tes mains et à tous moments je voudrais sangloter
    Sur toi sur celle que j'aime sur tout ce qui t'a épouvanté

    Tu regardes les yeux pleins de larmes ces pauvres émigrants
    Ils croient en Dieu ils prient les femmes allaitent les enfants
    Ils emplissent de leur odeur le hall de la gare Saint-Lazare
    Ils ont foi dans leur étoile comme les rois-mages
    Ils espèrent gagner de l'argent dans l'Argentine
    Et revenir dans leur pays après avoir fait fortune
    Une famille transporte un édredon rouge comme vous transportez votre coeur
    Cet édredon et nos rêves sont aussi irréels
    Quelques-uns de ces émigrants restent ici et se logent
    Rue des Rosiers ou rue des Écouffes dans des bouges
    Je les ai vu souvent le soir ils prennent l'air dans la rue
    Et se déplacent rarement comme les pièces aux échecs
    Il y a surtout des juifs leurs femmes portent perruque
    Elles restent assises exsangues au fond des boutiques

    Tu es debout devant le zinc d'un bar crapuleux
    Tu prends un café à deux sous parmi les malheureux

    Tu es la nuit dans un grand restaurant

    Ces femmes ne sont pas méchantes elles ont des soucis cependant
    Toutes même la plus laide a fait souffrir son amant

    Elle est la fille d'un sergent de ville de Jersey

    Ses mains que je n'avais pas vues sont dures et gercées

    J'ai une pitié immense pour les coutures de son ventre

    J'humilie maintenant à une pauvre fille au rire horrible ma bouche

    Tu es seul le matin va venir
    Les laitiers font tinter leurs bidons dans les rues

    La nuit s'éloigne ainsi qu'une belle Métive
    C'est Ferdine la fausse ou Léa l'attentive

    Et tu bois cet alcool brûlant comme ta vie
    Ta vie que tu bois comme une eau-de-vie

    Tu marches vers Auteuil tu veux aller chez toi à pied
    Dormir parmi tes fétiches d'Océanie et de Guinée
    Ils sont des Christ d'une autre forme et d'une autre croyance
    Ce sont les Christ inférieurs des obscures espérances

    Adieu Adieu

    Soleil cou coupé

    Guillaume Apollinaire (1880 - 1918)

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  2. “L’esprit nouveau qui s’annonce pretend tout hériter des classiques un solide bon sens, un esprit critique assure, des vues d’ensemble sur l’univers et dans l’âme humaine, et le sens du devoir qui dépouille les sentiments et en limite ou plutôt en contient les manifestations."

    Apollinaire, G. Oeuvres en Prose Complètes II. Éd. de P. Caizergues et M. Décaudin. Paris, Gallimard, 1991 (Col. Bibliothèque de la Pleiäde).

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  3. DE TARDE

    Naquele piquenique de burguesas,
    Houve uma coisa simplesmente bela,
    E que, sem ter história nem grandezas,
    Em todo o caso dava uma aguarela.

    Foi quando tu, descendo do burrico,
    Foste colher, sem imposturas tolas,
    A um granzoal azul de grão-de-bico
    Um ramalhete rubro de papoulas.

    Pouco depois, em cima duns penhascos,
    Nós acampámos, inda o Sol se via;
    E houve talhadas de melão, damascos,
    E pão-de-ló molhado em malvasia.

    Mas, todo púrpuro a sair da renda
    Dos teus dois seios como duas rolas,
    Era o supremo encanto da merenda
    O ramalhete rubro das papoulas!

    Cesário Verde

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  4. Barco Negro

    De manhã. que medo, que me achasses feia!
    Acordei, tremendo, deitada n'areia
    Mas logo os teus olhos disseram que não,
    E o sol penetrou no meu coração.

    Vi depois, numa rocha, uma cruz,
    E o teu barco negro dançava na luz
    Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas
    Dizem as velhas da praia, que não voltas:

    São loucas! São loucas!

    Eu sei, meu amor,
    Que nem chegaste a partir,
    Pois tudo, em meu redor,
    Me diz qu'estás sempre comigo

    No vento que lança areia nos vidros;
    Na água que canta, no fogo mortiço;
    No calor do leito, nos bancos vazios;
    Dentro do meu peito, estás sempre comigo.

    David Mourão Ferreira

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  5. Amei-te e por te amar
    Só a ti eu não via…
    Eras o céu e o mar,
    Eras a noite e o dia…
    Só quando te perdi
    É que eu te conheci…

    Quando te tinha diante
    Do meu olhar submerso
    Não eras minha amante…
    Eras o Universo…
    Agora que te não tenho,
    És só do teu tamanho.

    Estavas-me longe na alma,
    Por isso eu não te via…
    Presença em mim tão calma,
    Que eu a não sentia.
    Só quando meu ser te perdeu
    Vi que não eras eu.

    Não sei o que eras. Creio
    Que o meu modo de olhar,
    Meu sentir meu anseio
    Meu jeito de pensar…
    Eras minha alma, fora
    Do Lugar e da Hora…

    Hoje eu busco-te e choro
    Por te poder achar
    Não sequer te memoro
    Como te tive a amar…
    Nem foste um sonho meu…
    Porque te choro eu?

    Não sei… Perdi-te, e és hoje
    Real no […] real…
    Como a hora que foge,
    Foges e tudo é igual
    A si-próprio e é tão triste
    O que vejo que existe.

    Em que és […] fictício,
    Em que tempo parado
    Foste o (…) cilício
    Que quando em fé fechado
    Não sentia e hoje sinto
    Que acordo e não me minto…

    Fernando Pessoa

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  6. GARÇA
    Indiferente ao ruído do navio que zarpa,
    repousa na foz do rio, inerte.
    Nos olhos, não inermes,
    traz ocultas a flecha e a farpa
    e, no seu colo de garça,
    a graça sedutora de um astuto Hermes.

    "Se pensássemos que os olhos de uma rapariga como aquela não passam de uma brilhante rodela de mica, não ficaríamos ávidos de conhecer a sua vida e de a ligar a nós. Mas sentimos que o que brilha naquele disco reflector não se deve unicamente à sua composição material; que são as negras sombras, que nos são desconhecidas, das ideias que essa criatura concebe relativamente às pessoas e aos lugares que conhece - relvados dos hipódromos, areia dos caminhos para onde pedalando por campos e bosques me teria arrastado essa feiticeira, mais sedutora para mim que o peri do paraíso persa -, e também as sombras da casa em que vai entrar, dos projectos que constrói ou que construíram para ela; e sobretudo que é ela, com os seus desejos, as suas simpatias, as suas repulsas, a sua obscura e incessante vontade. Eu sabia que não possuiria aquela jovem ciclista se não possuísse também o que havia nos seus olhos negros."

    Marcdel Proust, EM BUSCADO TEMPO PERDIDO II, À SOMBRA DAS RAPARIGAS EM FLOR, trad. de Pedro Tamen, Lisboa, Relógio D'ÁGUA, 2003, pp. 379.

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  7. Na alvorada da modernidade, Toulouse-Lautrec, pintor de Paris, do Moulin Rouge, mostra-nos aqui um tema da vida moderna: a passageira de um cruzeiro a bordo do yacht em que viajava. Sofisticada, na toilette e na atitude, de acordo com o novo gosto, muito arte nova. Mesmo o facto de se tratar de um cartaz destinado a divulgar uma Exposição Internacional é particularmente significativo da época a que nos reporta este post. Ou seja, uma viagem também no tempo. "O pintor da vida moderna", de que nos falava Baudelaire, não foi Toulouse-Lautrec mas poderia ter sido...

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