domingo, 23 de fevereiro de 2014

Caminho, meu belo caminho... que dizes afinal sobre mim? (3) Pierre Sansot

O caminho, a marcha ininterrupta num caminho, faz-me, às vezes, melancolia. Ao seguir sempre em frente, não presto atenção àquele pequeno ribeiro, àquela criança na pradaria, da forma que o mereciam. De uma certa maneira, conduzia-me como um daqueles homens apressados que me indispõem. Dava mostras de ingratidão e de insensibilidade, em vez da disponibilidade que julgava evidenciar. Neste sentimento, havia algo ainda de mais patético. A condição humana surgia-me em toda a sua luz e em toda a sua crueza: um viajante que se não possa nunca fixar, e ao qual, um dia, o deslumbramento da sensibilidade será recusado.
Que relações tece o caminho com as paisagens, quando se inscreve num longo passeio? Temos de fazer questão de não as ignorar. Em primeiro lugar, porque, libertos da pressão do tempo e de qualquer tarefa, dispomos do tempo livre para as inspeccionar, as contemplar. Por outro lado, elas remetem constantemente para a nossa memória. São as quintas, as colinas, os edifícios, por vezes o oceano, que assumem a função de guiar dos nosso passos. O nosso corpo transmite de imediato essa informação, sustendo a respiração ou respirando à vontade, encolhendo-se ou curvando-se. É assim que nasce e nos acompanha uma segunda forma de paisagem, a que é repercussão quase inconsciente e mais próxima do nosso organismo. E, aliás, que satisfação tiraríamos do facto de andarmos, sem a diversidade de informações confusas que nos assaltam segundo a segundo?

Pierre Sansot, Chemins aux Vents. Paris, Éditions Payot et Rivages, 2002, p. 207-208.

1 comentário:

  1. LE PAS DE GRADIVA

    Alors, soudain...
    Il avait les yeux ouverts et regardait la rue dans toute sa longueur, mais il lui sembla qu'il faisait un rêve. Devant lui, tout à coup, venait de sortir quelque chose - à droite, un peu plus bas - de la maison de Castor et de Pollux, et sur les dalles qui s'étendaient de cette maison à l'autre côté de la Strada di Mercurio s'avançait, de sa démarche légère, Gradiva.
    Sans aucun doute, c'était bien elle, et quoique les rayons du soleil entourassent sa forme d'une sorte de voile d'or, il la voyait cependant distinctement, et précisément elle se présentait de profil comme dans le bas-relief. Elle inclinait légèrement en avant sa tête dont le dessus était recouvert d'une étoffe qui retombait sur sa nuque, elle tenait ramassé dans sa main gauche un pan de sa robe extraordinairement plissée, et qui ne lui tombait pas plus bas que les chevilles. Elle ne se fit clairement reconnaître qu'en marchant: le pied qui restait en arrière se dressait un instant sur sa pointe, le talon presque verticalement relevé.

    Sigmund Freud, DÉLIRE ET RÊVES DANS LA "GRADIVA" DE JENSEN, Paris, Gallimard, 1981, p. 52.

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