São Cristóvão, padroeiro dos viajantes, é um bom exemplo deste tipo de experiência. Segundo a lenda, ele orgulhava-se arrogantemente da sua tremenda força física e gostava de servir apenas aos mais fortes. Serviu primeiro a um rei; mas quando verificou que o rei tinha medo do diabo, deixou-o e passou a servir o diabo. Descobriu um dia que o diabo tinha medo do crucifixo e decidiu então servir Cristo, se o encontrasse. Um padre aconselhou-o a que esperasse Cristo no vau de um rio. Passaram-se vários anos, durante os quais ele carregou e ajudou muita gente a atravessar o rio. Mas uma vez, numa noite escura e tempestuosa, uma criança chamou-o para lhe pedir que o transportasse. São Cristóvão colocou-a aos ombros com toda a facilidade, mas a cada passo avançava mais lentamente, pois o seu fardo tornava-se cada vez mais pesado. Quando chegou ao meio do rio, pareceu-lhe que carregava "o universo inteiro". Percebeu nessa altura que era Cristo que trazia aos ombros, e Cristo absolveu-o dos seus pecados e deu-lhe a eternidade.
Esta criança milagrosa é o símbolo do Eu que literalmente deprime o ser humano comum, apesar de ser a única hipótese de o redimir. Em muitos trabalhos artísticos, Cristo é retratado com a esfera do mundo, o que significa claramente o Eu, já que a criança e a esfera são símbolos universais da totalidade.
M.-L. von Franz, "O processo de individualização" in AAVV, Os Homens e os seus Símbolos. Rio de Janeiro, Editorial Nova Fronteira, 1993, p. 218-219.
"A CRIANÇA ETERNA ACOMPANHA-ME SEMPRE"
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Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.
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Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam?
Alberto Caeiro, O GUARDADOR DE REBANHOS, VIII, IN Fernando Pessoa, OBRA POÉTICA, Rio de Janeiro, Aguilar Editora, 1969, p. 212.