Ulisses desterrado No mar da vida, Digo o teu nome e encho a solidão. Mas pergunto depois ao coração Por quanto tempo poderás ainda Tecer e destecer a teia da saudade... Vê se não desesperas E me esperas Até que eu volte, e à sombra da velhice Te conte, envergonhado, As indignas façanhas Que cometi Na pele do semi-deus que nunca fui... Sê tu divina, de verdade, aí, Nessa ilha de esperança, Fiel ao nosso amor De humanas criaturas. Faz que seja bonito O mito Das minhas aventuras.
Miguel Torga, ANTOLOGIA POÉTICA, Coimbra, ed. do Autor, 1981, p. 387.
Achado?! Como sinónimo de já feito, traçado por outrem? Metáforas da poesia. O caminho não se acha, traça-se de acordo com a circunstância (o Homem é a sua circunstância - Sartre) e opção de cada um, quantas vezes desbravando terreno...
A citação, Isabel, vai no sentido inverso do seu argumento. De facto a citação correcta é "o homem é o homem e a sua circunstancia", numa relação em nome do homem concreto contra o homem abstracto. Exactamente o que Casais Monteiro enuncia no seu poema. Parece-me.
O desejo, segundo Deleuze, não corresponde a uma falta. Não é um mal, não é algo negativo, como se crê comummente. Pelo contrário, o desejo funciona em nós como um motor que nos impulsiona à ação.
Neste poema, o desejo de um caminho não achado "oprime" o poeta, que considera, por isso,"aziago", o dia em que começou a senti-lo.
Acharia o caminho se não o desejasse? Cogitaria sequer nessa possibilidade? E a vida não é isso mesmo: uma constante demanda? Não é essa circunstância que lhe dá sentido?
Seremos capazes de conceber um mundo sem desejo? Ou melhor, seremos capazes de conceber um mundo de homens sem desejos? Seria no mínimo bastante insípido.
O existencialismo, partindo do princípio de que a existência precede a essência – o homem primeiro é e depois realiza-se através das suas ações e do que faz com a sua vida – analisa as relações deste com o mundo e não idealiza a natureza humana. Este princípio que pressupõe ponderação e angústia até à tomada de decisão e que coloca sobre o homem toda a responsabilidade das suas ações fascina-me (admitindo que também é válido para a mulher – permita-me que brinque). Porquê? Não acredito no destino, no fado, ou no que quiser chamar-lhe. Se acreditasse e crendo eu numa entidade suprema, criadora (e chame-lhe também Deus, Jeová, o que quiser consoante a religião) teria de a considerar muito injusta ou mesmo cruel, dadas as terríveis desigualdades vividas pela humanidade. Posso aceitar, como me parece que Sartre sugere em “Os Dados estão Lançados” (e onde já vai essa leitura…) um certo determinismo perante a circunstância, isto é, se pudéssemos voltar atrás, a circunstância repetir-se-ia igual e nós, mal ou bem, agiríamos do mesmo modo. Perante esta breve explanação que nem sei se estará muito clara e talvez até para minha defesa, não perante si, mas de acordo com a minha circunstância, não sei em que curva da vida, convenci-me que perante cada circunstância que se me depara, eu pondero, angustio-me, e quando decido é com a convicção de que aquela e não outra qualquer é a melhor opção que posso tomar. Aguento de peito aberto a responsabilidade dos meus atos, convencida que se errei posso corrigir, se não decidisse é que era mau e não me detenho a pensar e “se” eu tivesse decidido assim… em vez de… (a isso chamo o “pensamento mágico”, tortura a que recuso submeter-me). Tanta conversa para lhe dizer o quê? Talvez por vício de forma “as minhas orelhas abanem” a tudo o que possa parecer aligeirar a responsabilização de decisões. Terá acontecido. Não é a primeira vez que peco por pensar depressa de mais. Submeto-me, não por simpatia, mas porque sinceramente me convenceu, à sua interpretação do poema.
PENÉLOPE
ResponderEliminarUlisses desterrado
No mar da vida,
Digo o teu nome e encho a solidão.
Mas pergunto depois ao coração
Por quanto tempo poderás ainda
Tecer e destecer a teia da saudade...
Vê se não desesperas
E me esperas
Até que eu volte, e à sombra da velhice
Te conte, envergonhado,
As indignas façanhas
Que cometi
Na pele do semi-deus que nunca fui...
Sê tu divina, de verdade, aí,
Nessa ilha de esperança,
Fiel ao nosso amor
De humanas criaturas.
Faz que seja bonito
O mito
Das minhas aventuras.
Miguel Torga, ANTOLOGIA POÉTICA, Coimbra, ed. do Autor, 1981, p. 387.
Achado?! Como sinónimo de já feito, traçado por outrem? Metáforas da poesia. O caminho não se acha, traça-se de acordo com a circunstância (o Homem é a sua circunstância - Sartre) e opção de cada um, quantas vezes desbravando terreno...
ResponderEliminarA citação, Isabel, vai no sentido inverso do seu argumento. De facto a citação correcta é "o homem é o homem e a sua circunstancia", numa relação em nome do homem concreto contra o homem abstracto. Exactamente o que Casais Monteiro enuncia no seu poema. Parece-me.
ResponderEliminarO desejo, segundo Deleuze, não corresponde a uma falta. Não é um mal, não é algo negativo, como se crê comummente. Pelo contrário, o desejo funciona em nós como um motor que nos impulsiona à ação.
ResponderEliminarNeste poema, o desejo de um caminho não achado "oprime" o poeta, que considera, por isso,"aziago", o dia em que começou a senti-lo.
Acharia o caminho se não o desejasse? Cogitaria sequer nessa possibilidade? E a vida não é isso mesmo: uma constante demanda? Não é essa circunstância que lhe dá sentido?
Seremos capazes de conceber um mundo sem desejo? Ou melhor, seremos capazes de conceber um mundo de homens sem desejos? Seria no mínimo bastante insípido.
O existencialismo, partindo do princípio de que a existência precede a essência – o homem primeiro é e depois realiza-se através das suas ações e do que faz com a sua vida – analisa as relações deste com o mundo e não idealiza a natureza humana.
ResponderEliminarEste princípio que pressupõe ponderação e angústia até à tomada de decisão e que coloca sobre o homem toda a responsabilidade das suas ações fascina-me (admitindo que também é válido para a mulher – permita-me que brinque). Porquê? Não acredito no destino, no fado, ou no que quiser chamar-lhe. Se acreditasse e crendo eu numa entidade suprema, criadora (e chame-lhe também Deus, Jeová, o que quiser consoante a religião) teria de a considerar muito injusta ou mesmo cruel, dadas as terríveis desigualdades vividas pela humanidade. Posso aceitar, como me parece que Sartre sugere em “Os Dados estão Lançados” (e onde já vai essa leitura…) um certo determinismo perante a circunstância, isto é, se pudéssemos voltar atrás, a circunstância repetir-se-ia igual e nós, mal ou bem, agiríamos do mesmo modo.
Perante esta breve explanação que nem sei se estará muito clara e talvez até para minha defesa, não perante si, mas de acordo com a minha circunstância, não sei em que curva da vida, convenci-me que perante cada circunstância que se me depara, eu pondero, angustio-me, e quando decido é com a convicção de que aquela e não outra qualquer é a melhor opção que posso tomar. Aguento de peito aberto a responsabilidade dos meus atos, convencida que se errei posso corrigir, se não decidisse é que era mau e não me detenho a pensar e “se” eu tivesse decidido assim… em vez de… (a isso chamo o “pensamento mágico”, tortura a que recuso submeter-me).
Tanta conversa para lhe dizer o quê? Talvez por vício de forma “as minhas orelhas abanem” a tudo o que possa parecer aligeirar a responsabilização de decisões. Terá acontecido. Não é a primeira vez que peco por pensar depressa de mais. Submeto-me, não por simpatia, mas porque sinceramente me convenceu, à sua interpretação do poema.
Obrigado Isabel, pelos seus comentários oportunos e estimulantes.
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