terça-feira, 24 de dezembro de 2013
Espero o regresso dos navios. Albert Camus
Cresci no mar e a pobreza foi-me favorável, depois perdi o mar, todas os luxos a partir daí me pareceram cinzentos, a miséria intolerável. Desde então espero. Espero o regresso dos navios, a casa das águas, o dia límpido. Sou paciente, estou preparado com todas as minhas forças. Vêem-me passar em belas ruas sábias, admiro as passagens, aplaudo como toda a gente, dou a mão, não sou eu que falo. Sou alugado, sonho um pouco, ofendem-me, mal me espanto. A seguir esqueço e sorrio a quem me ultraja, ou saúdo com excessiva cortesia aquele que amo. Que fazer, se não disponho de memória para mais do que uma imagem? Resta-me enfim dizer que existo. "Nada mais, nada mais..."
Albert Camus, L'Été. Paris, Gallimard, 1954 [La Mer au Plus Prés, 1953]
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Ó naus felizes, que do mar vago
ResponderEliminarVolveis enfim ao silêncio do porto
Depois de tanto nocturno mal
[...]
Fernando Pessoa, CANCIONEIRO, IN OBRA POÉTICA, Rio de Janeiro, José AguilarEd., 1\969, p. 107.