domingo, 28 de abril de 2013

Metamorfose mágica: Paris! Aquilino Ribeiro


Quando se vai de Barrelas para Moimenta da Beira, logo adiante da Soutosa, à esquerda, encontra-se Ariz. Um dia, mão chocarreira propôs a este nome, com um bocado de carvão, nas placas da estrada, um P.
Graças a tal enxerto, a localidade mais ínfima da Beira tornou-se a cidade mais orgulhosa do Universo. Fabulosa imaginação, a do alfabeto!

Aquilino Ribeiro, Geografia Sentimental. História, Paisagem, Folclore. Lisboa, Bertrand, 2007, p. 34.

16 comentários:

  1. Há uma pequena (pequenísima) aldeia em Trás-os-Montes que se chama França. Já lá estive e tirei uma fotografia junto à placa informativa desse nome.

    E assim, por um outro tipo de magia me vi em França, sem passar por Espanha (bem perto por sinal) e sem sequer sair de Portugal.

    A propósito: que pena Aquilino ser presentemente um autor tão esquecido!

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  2. Não sei se concordo com Aquilino (estou a ser simpática – não concordo). A magia não está no alfabeto, está em nós, nas nossas lembranças e mais uma vez, nos nossos afetos. O alfabeto não é mais que um mero e limitado instrumento a que recorremos. O que seria das palavras sem as ideias. Estas antecedem aquelas. E é claro que Aquilino sabia bem isso, mas usava as palavras com extraordinária mestria .
    Quem antepôs o grafema P, à toponímia tê-lo-á feito porquê? Como disse Victor Hugo? (reporto-me à sua citação no mural do facebook) E Manuel António Pina? (e recordo um “assalto” que fiz em “o que eu andei…”) E inconscientemente a questão está sempre presente, o que é e de que vive o imaginário? Eu vou mais longe. A memória… Viveria o Homem sem memória afetiva?

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  3. Esta ideia de provar que não sou um robô... Que tem o meu amigo contra a tecnologia de ponta?
    Acha que um robõ conseguiria igualar-me em raciocínios retorcidos? :)

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  4. Raciocínios retorcidos não sei que sejam. Ou bem que são raciocínios, ou não passam de impressões, gritos de alma, desabafos, profissões de fé, eu sei lá, ditos sem fundamento racional, sequer razoável....

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  5. Os “ditos sem fundamento racional, sequer razoável…” são facilmente explicáveis. Digamos que em filosofia há duas correntes que explicam a existência do Homem: A filosofia essencial (Aristóteles, S. Tomás de Aquino…) que defende que a essência do homem é o pensamento, antecedendo este a existência (“O homem é um animal racional”); a filosofia existencial (Gabriel Marcel; Sartre, Simone de Beauvoir…) que por oposição defende que o homem existe primeiro (“se existo, sou”) e isso é que propicia a essência. Ora a minha prof.ª de filosofia dizia muitas vezes que se Pascal conhecesse os seus alunos nunca diria que “O homem é um animal racional” Partindo do princípio que também é verdade para a Mulher… concluo facilmente que serei existencialista e possivelmente ainda não atingi a essência…:)
    Não se zangue com as minhas tolices. Adoro argumentar e não resisti a brincar consigo.

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  6. Obrigado, Isabel, pela lição de filosofia, que me coube em sorte por causa da ideia peregrina de questionar o inquestionável. Vou ficar, bem sentado, à espera da próxima!

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  7. As “meninas ladinas” adoram arreliar os meninos “bem comportados” que amuam. Julga que alguma se mete com o “queixinhas” que vai contar à professora que elas divulgam os “elogios” que são feitos nas aulas ou que tiram essas conclusões “brilhantes” dos ensinamentos? Não. A professora deixava-as sem orelhas.

    O meu caro amigo acertou “na mouche”. O meu raciocínio não se processa como o da maioria das pessoas seguindo a lógica aristotélica (que para mim foi um tormento estudar). Não sou eu que digo. Foi alguém entendido que “há muitas luas” fez o meu retrato psicológico (sem eu saber que estava a ser feito) e mo entregou em folhas A4. Processa-se por associações que se sobrepõem, absolutamente fora dos padrões usuais. Mas não foi “o seu amigo” Bachelard que escreveu que “o devaneio retoma sempre os temas primitivos, apesar dos êxitos do pensamento elaborado, contra a própria instrução das experiências científicas” (A Psicanálise do Fogo)?

    Então largue o “burro” levante o rabo da cadeira e vá brincar que o tempo de recreio é curto e passa depressa. E já agora, guarde segredo: os outros não precisam de saber que eu sou tonta.

    Este comentário também não carece de publicação, para não se assumir como pegada de rinoceronte nos canteiros deste jardim. Pode publicá-lo ou deitá-lo fora. Faça como entender. Abraço fraterno.

    PS. Já reparou no que deu “Paris”. Que peso não terá no meu imaginário? Talvez, como S. Martinho do Porto, tenha a ver com a minha relação com o espaço... :)

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  8. Paris ou P - Ariz? Para Aquilino, que conhecia bem Paris (ali aportou ainda antes da Republica e lá casou em primeiras núpcias) a ironia, mais do que um efeito era um recurso.

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  9. A ironia fina é sempre uma forma sofisticadíssima de raciocínio. E quando a intenção não é demolidora consegue despertar em nós sensações eidéticas. Bastou P - Ariz para eu ficar a perguntar-me se o velhote dos passarinhos ainda aparece aos domingos, nas tardes de sol, no Jardin des Tuileries...

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  10. Velhote passarinhos? Jardin des Tuileries? Agora é que me "apanhou". Não faço a menor ideia do que está a falar! É um código? Um expediente para me deixar curioso? Mas olhe que eu não pergunto nada.

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  11. Sempre ouvi dizer que os homens mentiriam menos se as mulheres fizessem menos perguntas e não o contrário. Simplesmente porque as mulheres não mentem; limitam-se a omitir factos… :)
    O seu comentário deu tantos metros de corda ao papagaio, que quando dei por mim já tinha escrito cerca de setecentas palavras e ainda não tinha chegado a Paris. Aí parei e retrocedi. Ah! O João não tem culpa de essa cidade ser o cenário do meu imaginário!
    Embora não me chamando Gisèle, também eu fui numa primavera a Paris. Os vinte anos já lá iam. Como não fui de bicicleta, não houve furo embaraçoso que me proporcionasse um Pierre simpático para me mostrar a cidade. O furo fi-lo eu no programa do passeio, levando atrás de mim uma senhora que havia sido minha professora e um casal: “Isabel, se nos perdemos?” “Alguém nos há-de achar…” Imagine! Eu que sou capaz de cometer a proeza de me perder em Lisboa, andei a servir de cicerone em Paris: metro, autocarro, passeio a Versalhes (que não estava incluído no programa)… de mapa na mão, com três pessoas atrás…
    E deambulando por Paris, conheci num domingo à tarde, au Jardin des Tuileries, um velhote pequenino, de boina basca, que exibia os passarinhos amestrados, pretendendo recolher algumas moedas. Quedei-me a olhá-lo. Era um extraordinário comunicador, nitidamente um animal de palco. Não sei quem meteu conversa com quem, mas o meu francês dos Marrazes, deu para ficar a saber que aquele era o sítio onde se exibia em cada domingo de sol. E que multidão reuniu à sua volta! Não é código. É uma recordação luminosa de uma tarde de sol.
    Num outro dia convenci a minha ex-professora a almoçar comigo, sandes e fruta, no dito jardim (o casal foi ao restaurante porque o marido não dispensava comer de prato – os homens às vezes são complicados… e as mulheres também :)) e até consegui que se deitasse num banco a olhar para o céu. Brinquei “Posso tirar uma foto para publicar no “Região de Leria? Acho que ia ser divertido, nem o seu marido a reconheceria.” (o marido era um militar de alta patente com um cargo importante cá no burgo) E juntou-se-nos uma outra mulher, possivelmente empregada doméstica. Não conseguimos saber de que nacionalidade, porque não falava qualquer língua que entendêssemos, mas almoçámos as três confraternizando entre sorrisos e gestos ( a minha filha mais nova se lá estivesse não deixaria de dizer como em Londres ”não te posso trazer à rua”).
    Ainda existem aquelas esplanadas pequeninas em Champs Elysées, em frente aos cafés? E os mercados de rua, com flores e produtos hortícolas?
    E lá ia outra vez o papagaio a voar alto…

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  12. Esplanadas pequeninas creio que não. Como noutras cidades, os Champs Elysées foram invadidos por aquários com pessoas dentro. Mas os mercados de rua, sim. Numa das ultimas visitas a essa cidade que também é a minha cidade de eleição, detive-me a visitar um desses mercados, com frutas, peixe, bivalves, cogumelos, queijos, produtos hortícolas, um festival de cores e cheiros apetitosos

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  13. Ontem, desci a Almoinha Grande. Caminhava a pé até aos Correios quando encontrei um amigo que saía do ginásio que também já frequentara. “Acho bem que malhes nesse cabedal”- ironizei. E parei a saber da esposa, que já não via há algum tempo. Ele retribuiu o cumprimento: “nem preciso de perguntar se estás bem, basta olhar para o sorriso que trazes na cara”.
    Seguimos cada um ao que ia, sem que me conseguisse furtar ao pensamento de que foi aquele grafema, precursor de graffiti, que tão bem inspirou este pedaço de prosa a Aquilino e que o João em boa hora publicou no seu blogue, que o originaram.
    Eu tinha perdido os sonhos “algures” (é onde perco tudo…). Sentia-me uma pintora sem a paleta das cores e de repente este pequeno excerto e esta troca de comentários, devolveram-me o arco-íris. Até voltei a ser Justine…
    Devo-lhe mais um favor, que nem sonha que me fez. Bem haja!

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  14. Ah! Espero que a escadaria do Palácio Garnier continue intacta. :)

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  15. Se eu soubesse que tinha esse dom, o de prestar favores de forma não intencional, passaria a cultivá-lo com todo o afinco.

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  16. "A imagem literária não veste uma imagem nua, não dá a palavra a uma imagem muda. A imaginação, em nós, fala, os nossos sonhos falam, os nossos pensamentos falam. Toda a atividade humana deseja falar...
    A imagem literária é um explosivo. Faz explodir de súbito as frases feitas, quebra os provérbios que passam de idade em idade, faz-nos ouvir os substantivos depois da sua explosão, quando abandonaram o martírio da sua raiz, quando cruzaram a porta das trevas, quando transmutaram a sua matéria.Em suma, a imagem literária põe as palavras em movimento, enrega-as às suas funções de imaginação."
    " Gaston Bachelard, O Ar e os Sonhos

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