Em suma, sempre houve estações de metro na minha vida
escolar, profissional e familiar; posso dar conta desse “estado civil” com
termos precisos, do tipo dos que usamos num curriculum vitae. Nesse aspecto, os
meus itinerários são semelhantes aos de outros, que acompanho todos os dias no
metro, desconhecendo em que escola andaram, onde viveram e trabalharam, donde
vêm e para onde vão. No momento em que os nossos olhares se encontram para logo
se desviarem, depois de por breves instantes às vezes de terem detido, talvez
eles também estejam em vias de traçar um balanço, de fazer um ponto de situação
e, quem sabe?, encarar uma mudança de vida e, acessoriamente, de linha de
metro.
As linhas de metro, de facto, como as da mão, cruzam-se; não
apenas no plano em que se desenrolam e ordenam as ligações dos seus percursos
multicores, mas na vida e na cabeça de cada um. Sucede aliás que elas se cruzam
sem se cruzar, justamente à maneira das linhas da mão; parece que se ignoram,
auto-suficientes e monocromáticas, traços que ligam definitivamente um ponto a
outro sem se preocuparem com ramificações mais discretas que possibilitam a
quem delas se sirva mudar radicalmente de orientação. Na terminologia do utente
do metro, convém para obter esse resultado, “mudar duas vezes”.
Marc Augé, Un Ethnologue dans le Métro. Paris, Librairie
Arthème Fayard/Pluriel, 2013, p. 11-12.
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