sexta-feira, 26 de abril de 2013

As linhas de metro, de facto, como as da mão, cruzam-se. Marc Augé


Em suma, sempre houve estações de metro na minha vida escolar, profissional e familiar; posso dar conta desse “estado civil” com termos precisos, do tipo dos que usamos num curriculum vitae. Nesse aspecto, os meus itinerários são semelhantes aos de outros, que acompanho todos os dias no metro, desconhecendo em que escola andaram, onde viveram e trabalharam, donde vêm e para onde vão. No momento em que os nossos olhares se encontram para logo se desviarem, depois de por breves instantes às vezes de terem detido, talvez eles também estejam em vias de traçar um balanço, de fazer um ponto de situação e, quem sabe?, encarar uma mudança de vida e, acessoriamente, de linha de metro.
As linhas de metro, de facto, como as da mão, cruzam-se; não apenas no plano em que se desenrolam e ordenam as ligações dos seus percursos multicores, mas na vida e na cabeça de cada um. Sucede aliás que elas se cruzam sem se cruzar, justamente à maneira das linhas da mão; parece que se ignoram, auto-suficientes e monocromáticas, traços que ligam definitivamente um ponto a outro sem se preocuparem com ramificações mais discretas que possibilitam a quem delas se sirva mudar radicalmente de orientação. Na terminologia do utente do metro, convém para obter esse resultado, “mudar duas vezes”.

Marc Augé, Un Ethnologue dans le Métro. Paris, Librairie Arthème Fayard/Pluriel, 2013, p. 11-12.

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