Foto de João Peixoto
As pedras da cidade são porosas
Obrigado, Senhor Presidente da Câmara.
Em si cumprimento a Câmara Municipal de Guimarães, e em si agradeço a distinção que acaba de me ser outorgada e que mereceu aprovação municipal.
Recebo esta medalha com emoção e sentido de partilha. A emoção resulta da consciência, agora mais nítida, de um caminho que se percorreu, de uma página que se virou neste projecto tão empolgante como absorvente.
Olho para o lugar que me acolheu, que me interpelou, que me confiou uma pequena parte do seu destino, e nele adivinho uma cidade que me acompanha (que é afinal a utopia maior da nossa cidade).
Sempre entendi que a responsabilidade que me foi cometida constituía exactamente um mandato. Um mandato recebido de si, senhor Presidente, da Câmara a que preside, da cidade. Um mandato que me competia exercer com probidade e dedicação, nele aplicando experiência e saber adquiridos e nele reflectindo entendimentos e expectativas das pessoas que construíram e constroem este território.
Assim, o galardão reconhece um serviço prestado, mas em última analise reconhece a sua conformidade com o mandato recebido.
Quero assinalar aqui e manifestar a mais sincera gratidão a todos os que me ajudaram a efectivar esse mandato. Ao Dr. António Magalhães, que me fez participar da sua visão experimentada e beneficiar da sua liderança esclarecida, à Dr.ª Francisca Abreu, a quem a Capital Europeia da Cultura tanto deve em clarividência intelectual e entrega pessoal. Aos lideres dos partidos políticos representados nos órgãos de poder local, que souberam preservar o consenso em torno do projecto, sem abandono dos seus pontos de vista próprios. E, enfim, às organizações e instituições públicas e privadas, às empresas, da densa sociedade vimaranense, que forjaram parcerias empenhadas na realização e projecção de Guimarães 2012.
A partilha também tem destinatários pessoais e institucionais. Os administradores da Fundação Cidade de Guimarães - Rosa Amora, Paulo Cruz, Francisca Abreu, Fortunato Frederico. Os seus directores - Carlos Martins, Cláudia Leite, José Bastos - e respectivas equipas. Os seus programadores - Gabriela Vaz-Pinheiro, João Lopes, Marcos Barbosa, Rui Massena, Susana Ralha, Tom Fleming, Elisabete Paiva, Eduardo Meira e respectivas equipas. O seu secretariado de Administração, com Joaquina Campos. As suas equipas de produção, a primeira das quais, A Oficina. As inúmeras instituições parceiras locais - como a Sociedade Martins Sarmento, a Academia de Musical Vimaranense, o Cineclube, que trouxeram a este projecto imaginação, exigência e qualidade. O consórcio associativo que integrou a programação - o CAR, o Convívio e a Associação de Folclore e Etnografia. A Universidade do Minho, os museus nacionais e as escolas básicas e secundárias dos agrupamentos do concelho. Uma menção aos voluntários que do dia a dia deste projecto fizerem com tanto entusiasmo o seu próprio dia a dia.
Sinto-me orgulhoso ter feito parte de um projecto do qual posso dizer com propriedade, que realizou a máxima “um por todos”.
Uma palavra também de gratidão e partilha para com os outros órgãos de Fundação Cidade de Guimarães, Conselho Fiscal e Conselho Geral, este aqui representado pelo seu Presidente. Foi a vossa palavra oportuna e corajosa e o vosso gesto esclarecido que permitiu a este projecto vencer muitos obstáculos. Obrigado, Dr. Jorge Sampaio! Foi bom voltar a trabalhar consigo.
Muitas vezes me pergunto qual o horizonte que circunscreve o nosso papel de cidadãos. É a cidade que nos urbaniza, mas somos nós que a humanizamos. Se a urbanidade é um fautor de civilização, a humanidade é garante dos valores generosos. É por isso que na cidade somos sempre espectadores e actores. No sofrimento, como na alegria, na acção como na contemplação.
As cidades são as suas pedras, talhadas e erguidas ao longo de gerações. Mas as pedras da cidade são porosas: estão prontas a receber a nossa energia e a devolvê-la em sonho. É graças a essa porosidade que continuamos a criar, a pensar, a amar.
Só a cidade nos transmite essa noção de continuidade, a consciência de que somos mediadores e de que a nossa experiência viverá no futuro numa outra memória. A cidade é, por definição, o lugar onde real e imaginário se sobrepõem e confundem.
Essa foi, para todos nós, a lição que Guimarães nos deu pela forma como percebeu e viveu a sua Capital Europeia da Cultura.
Guimarães, 24 de Junho de 2013
João Serra